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Como lidar com a dor do luto em tempos de distanciamento social
por Gislan Vitalino
Publicado em 14 de maio de 2021 às 16:32 / Atualizado em 14 de maio de 2021 às 19:49
Na última terça-feira (11), o Espírito Santo ultrapassou a marca de 10 mil mortes por Covid-19. Cada óbito incluso nesse número, além de representar uma família ou amigos que se despedem de uma pessoa querida, também representa uma dor diferente da que conhecíamos antes da pandemia do novo coronavírus. Ritos importantes, como velórios e cerimônias de sepultamento, devem ser evitados em caso de vítimas da Covid-19, seguindo as orientações das autoridades sanitárias.
De acordo com as orientações da Secretaria de Saúde do Espírito Santo, os velórios estão proibidos e os sepultamentos devem acontecer sem contatos físicos, caixões lacrados, uso de máscaras e sem a presença de idosos, gestantes ou pessoas com comorbidades. A orientação é que apenas no máximo 10 pessoas estejam presentes e mantenham distância mínima de um metro e meio entre elas.
Mas em meio a tantas normas técnicas e restrições, a já difícil dor de se perder uma pessoa significativa, pode ficar ainda mais difícil de ser enfrentada. Para entender esse processo e se existem formas de amenizar esse agravamento, conversamos com a Drª. Alba Sampaio (@albasampaiopsico), psicóloga clínica, professora, consteladora familiar e psicodramatista, sobre o tema.
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Ela nos lembra, que o cuidado é próprio da característica humana que se reflete no processo de luto. “Nós, seres humanos, somos seres afetivos e a nossa cultura de lidar com a perda e com o luto vem acompanhada do desejo de zelar por quem se foi, velando e fazendo uma cerimônia mesmo que simples. Além de abraçar, cuidar de quem sente a dor da perda do ente querido”, esclarece Alba.
Com a pandemia, entretanto, a possibilidade de cuidados se limita. “O rito da perda, normalmente envolve um processo de adoecimento, cuidado e a morte do ser amado. Vem a dor da saudade, posteriormente, é claro. Só que na pandemia isso não tem acontecido: o ente querido é internado, o familiar não pode acompanhar e quando falece, a família recebe o corpo no caixão lacrado!”, frisou a psicóloga.
As limitações da pandemia, que restringem as demonstrações de afeto, mas ampliam a dor da perda, dificultam o momento, já difícil, de se perder um ente querido. “Com a pandemia, tudo se tornou muito mais complexo. Quando esse rito de cuidado é limitado, o processo de luto é mais dolorido”, explicou Alba Sampaio.
O cuidar do outro em tempos de pandemia
Para a psicóloga, um dos erros mais comuns ao lidar com a dor é exigir que o outro enfrente-a de forma “tranquila”, o que, naturalmente, não acontece. “Nós precisamos desconstruir um processo que chamamos de interdição do luto. Ninguém está preparado para a morte e quando perdemos alguém temos de nos permitir chorar e sentir a dor”, orienta. “Dessa forma, vamos acolher o enlutado com amor e cuidado. Ligue para ele, mande mensagens de carinho e principalmente, ouça-o sem nenhum juízo de valor. Deixando-o falar o que sente. Caso o enlutado não supere, é preciso buscar ajuda psicológica e médica”, destacou Alba Sampaio.
Dessa forma, mensagens que visam acalmar, mas que acabam transmitindo que quem perde um parente precisa ser forte, precisa entender/superar a perda, não são ideais. “O luto é um processo de lidar com a perda. É preciso vivenciar a negação, a raiva, a barganha e a depressão, porque esse processo naturalmente vai levar à aceitação. É preciso chorar, sentir a dor e se for preciso, buscar ajuda, mas jamais deve-se incentivar a interrupção do processo de luto”, contou a psicóloga.
Luto em poesia
Alba Sampaio conta que também vivenciou de perto a dor de querer cuidar. No dia em que Guarapari perdeu o querido Professor Chicão, Alba esteve na casa dele, e a esposa Neinha Siqueira estava chegando do hospital. Naturalmente, a amiga estava arrasada e devido às restrições da pandemia, Drª Alba ficou impossibilitada de abraçar a amiga, que tinha acabado de perder o esposo. De acordo com a Psicóloga, o momento foi doloroso e reflexivo.
Alba contou a situação difícil ao seu irmão, Manoel Sampaio, que se inspirou para escrever o poema abaixo.
Recado da amiga à amiga que perdeu seu amor pelo Covid-19
Como lhe acolher sem lhe abraçar?
Como chorar minhas lágrimas
Se elas não podem cair sobre o seu ombro?
Como expressar algo que deve ser falado
Próximo ao ouvido de quem precisa ouvir o som
E sentir o sopro que sai das palavras?
Eu não sabia que seria assim.
Não imaginava que um dia eu iria
Lhe consolar com os meus olhos,
Lhe confortar com meu choro
E lhe abraçar tocando o ar!
Escute…
Que a sua dor
De se despedir sem despedir-se
E de não conseguir dar o seu último beijo,
Seja anestesiada pela sua grandeza,
Aliviada pelas suas conquistas,
Diluída pelo amor de todos que aqui ficaram.
Que a lembrança do seu amor que partiu
Seja compensada pelo meu abraço de luz,
Pela expressão do meu olhar carinhoso,
Pelo som das minhas palavras de consolo à distância
E por TODAS as lágrimas de afeto
Que não puderam cair sobre os seus ombros.
Manoel Sampaio Junior – @manoelsampaiojunior
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